Imóvel pode ser penhorado sem que proprietário tenha figurado na ação de cobrança de dívida condomin
O proprietário do imóvel
gerador de débitos condominiais pode ter o seu bem penhorado na fase de
cumprimento de sentença, mesmo não tendo figurado no polo passivo da ação de
cobrança. Com base nesse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que
havia entendido que a medida afrontava o artigo 472 do Código de Processo Civil
de 1973.
O
caso analisado é resultado de embargos de terceiro opostos pela proprietária do
imóvel contra o condomínio, com os quais ela buscava evitar a penhora do bem –
decorrente de condenação em ação de cobrança de cotas condominiais. A
proprietária argumentou que o fato de a obrigação ser propter rem não
a transforma em sujeito passivo da execução, pois não participou da formação do
título executivo.
Em
primeiro grau, o pedido da proprietária foi rejeitado. Porém, o tribunal
paulista reconheceu a impossibilidade da penhora, sob o argumento de que seria
inviável redirecionar a execução a pessoa que não figurou na relação jurídica
originária.
No
recurso ao STJ, o condomínio sustentou que, diante da característica propter
rem da obrigação condominial, cada unidade imobiliária responde pelas
suas despesas, independentemente de quem as originou ou da própria vontade do
proprietário.
O
recorrente argumentou também que, esgotados todos os meios para recebimento dos
débitos e impedida a penhora, os demais condôminos ficariam claramente
prejudicados, uma vez que os encargos seriam rateados entre eles, enquanto a
devedora continuaria usufruindo de todos os serviços do condomínio.
Propter rem
A
relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, explicou que a obrigação de
pagamento das despesas condominiais é de natureza propter rem, ou
seja, é obrigação "própria da coisa", caracterizada pela
particularidade de o devedor se individualizar única e exclusivamente pela
titularidade do direito real, desvinculada de qualquer manifestação de vontade.
De
acordo com a relatora, essa característica também incide sobre determinada
pessoa por força de determinado direito real, isto é, só existe em razão da
situação jurídica do obrigado, de titular do domínio ou de detentor de
determinada coisa.
Para
a ministra, a obrigação propter rem é equivalente ao
compromisso imposto aos proprietários e inquilinos das unidades de um prédio de
não prejudicarem a segurança, o sossego e a saúde dos vizinhos.
Relação material
A
relatora lembrou que, no julgamento do REsp
1.345.331, a Segunda Seção firmou a tese segundo a qual "o que
define a responsabilidade pelo pagamento das obrigações condominiais não é o
registro do compromisso de compra e venda, mas a relação jurídica material com
o imóvel, representada pela imissão na posse pelo promissário comprador,
dependendo das circunstâncias de cada caso concreto".
Nancy
Andrighi também citou que, no REsp
1.704.498, a Terceira Turma decidiu pela possibilidade de a
arrendatária do imóvel figurar no polo passivo de ação de cobrança de despesas
condominiais, pois é ela quem exerce a posse direta sobre o bem e quem, em
realidade, usufrui dos serviços prestados pelo condomínio.
Desse
modo, a ministra apontou que "a ação de cobrança de débitos condominiais
pode ser proposta em face de qualquer um daqueles que tenha uma relação
jurídica vinculada ao imóvel, o que mais prontamente possa cumprir com a
obrigação".
Coisa julgada
O
caso analisado – observou a relatora – ocorreu na vigência do CPC/1973, cujo
artigo 472 define que os efeitos da coisa julgada são restritos àqueles que
participam da ação judicial, não beneficiando nem prejudicando estranhos à
relação processual.
"No
entanto, essa regra não é absoluta e comporta exceções. Em determinadas
hipóteses, a coisa julgada pode atingir, além das partes, terceiros que não
participaram de sua formação", destacou.
Segundo
Nancy Andrighi, a partir da premissa de que o próprio imóvel gerador das
despesas constitui garantia do pagamento da dívida, dada a natureza propter
rem da obrigação, pode-se admitir a inclusão do proprietário no
cumprimento de sentença em curso.
"A
solução da controvérsia perpassa pelo princípio da instrumentalidade das
formas, aliado ao princípio da efetividade do processo, no sentido de se
utilizar a técnica processual não como um entrave, mas como um instrumento para
a realização do direito material. Afinal, se o débito condominial possui
caráter ambulatório, não faz sentido impedir que, no âmbito processual, o
proprietário possa figurar no polo passivo do cumprimento de sentença",
afirmou.